Redes sociais servem ao capital, não à igualdade
ESPALHA --->
“O fato é que, como já podemos perceber no campo da política eleitoral, os algoritmos são guiados pelos instintos humanos mais básicos – ódio, paixão, raiva, nojo, ternura, tesão – e, se não houver algum nível de governo sobre esses mecanismos, tendemos simplesmente ao fascismo, à violência em múltiplas formas.
Isso não é especulação: ex-funcionários das big techs têm, cada vez mais, vindo a público para denunciar que, da forma como as plataformas funcionam hoje, não há escrúpulos em utilizar violência, discursos de ódio ou apelos sexuais, desde que os dólares continuem fluindo para os bolsos dos bilionários do Vale do Silício.
Se o resultado de plataformas desgovernadas, na política, são governantes fascistas, que tipo de rap ou trap está sendo privilegiado?”, questiona o professor Spensy Pimentel em trecho do Livro Vermelho do Hip-Hop – Remasterizado.
LUCRO E ESVAZIAMENTO DA DEMOCRACIA
Seguimos nos trilhos da comunicação criados nas plataformas digitais que fortalecem a manipulação, a desinformação e o lucro, moldando o Hip Hop, a indústria do rap e, num âmbito mais amplo, enfraquecendo a democracia e aprofundando desigualdades. Para grande parte da cena, fazer de tudo para entrar no jogo do algoritmo passa a ser visto como a única opção para levar suas ideias, músicas e discursos.
Em artigo publicado no Poder360, Roger Ferreira afirma que “as redes sociais podem, sim, promover mais soluções e menos problemas”, desde que exista a consciência de que “a comunicação é também responsabilidade social”. O debate é necessário, mas esbarra no capital, o que realmente move as grandes plataformas. A lógica de mercado molda tanto o conteúdo que circula quanto às formas de interação entre as pessoas, transformando a comunicação em instrumento de dominação e lucro.
Na política cotidiana, as redes se tornaram centrais na dinâmica democrática, mas o design que as sustenta tem efeitos profundos e muitas vezes destrutivos. A professora Lisa Schirch alerta que as escolhas de design, como algoritmos que priorizam conteúdo emocional e escandaloso, moldam não apenas o que os usuários veem, mas também como se comportam e reagem às informações.
O resultado é um ambiente em que a mistura entre fatos verificados e teorias da conspiração distorce a realidade e compromete a integridade da informação. A cena Rap e Hip Hop brasileira não está imune a essas distorções. Um dos nossos principais problemas é a falta de discussões mais sérias sobre o tema entre os artistas, produtores e a comunidade.
De acordo com especialistas da área, o engajamento é o núcleo do modelo de negócios. Plataformas que se apresentam como democráticas dependem da emoção e da polarização para gerar lucro. Quanto mais divisão e caos, maior o tempo de permanência e, consequentemente, mais dados e anúncios. A desigualdade social se transforma em insumo para a economia da atenção, e não em pauta a ser enfrentada.
AMEAÇA
De acordo com os artigos de Roger e Lisa, regimes autoritários que se utilizam da tecnologia para controle social, agravam esse cenário. A falta de responsabilidade das grandes corporações digitais permite a manipulação em larga escala, alimentando a desinformação e corroendo a confiança nas instituições. O que se vende como liberdade de expressão se torna uma vitrine para interesses econômicos e políticos.
No Brasil, criadores de conteúdo independentes e coletivos periféricos, que tentam levar a ideia de um outro mundo possível, enfrentam a falta de visibilidade, ausência de remuneração e controle algorítmico sobre o alcance. O resultado é o que veículos como o Bocada Forte enfrentam todos os dias: o discurso de inclusão usado como estratégia de imagem das redes proprietárias escondem as estruturas que seguem reproduzindo desigualdade e exploração.
A comunidade combatente do Hip Hop luta pelo desenvolvimento de tecnologias pensadas para estimular o diálogo, a transparência e a construção coletiva, demonstrando que o design das redes sociais pode servir ao interesse público e não apenas ao lucro corporativo.
Mas não há ilusão, essas plataformas foram projetadas para atender ao capital e não à comunidade. Elas continuarão produzindo mais ruído do que debate, mais controle do que comunicação, mais desigualdade do que democracia. Enquanto muitos dos nossos seguem o fluxo de adaptação como única via, uma parcela militante busca formas de expressar as demandas coletivas. Sabemos de que lado devemos estar.


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