Com DJ Raylan campeão mundial, DMC celebra longevidade do turntablism
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DMC celebra passado, presente e futuro do turntablism
Presente na 40ª edição do campeonato mundial de discotecagem DMC, o BF conversou com o campeão DJ Raylan e com a ‘lenda viva’ DJ Babu
GILBERTO YOSHINAGA, DE TÓQUIO (JAPÃO)

O DMC DJ World Championships, campeonato mundial de turntablism, celebrou 40 anos de existência em sua última edição, realizada nos dias 11 e 12 de outubro, em Tóquio (Japão). O Brasil esteve representado pelo DJ cinco vezes campeão mundial Erick Jay, na condição de jurado, além dos competidores DJ Shinpa e DJ Raylan – que, aos 20 anos de idade, se sagrou campeão mundial na categoria Battle for Supremacy.
O Bocada Forte esteve presente no evento para constatar que, apesar das transformações ocorridas com o cada vez mais veloz advento tecnológico, a arte de manipular os toca-discos continua mais viva do que nunca. Até o momento, os avanços da tecnologia têm incorporado novas ferramentas ao turntablism, mas nada que implique, por enquanto, em significativas mudanças técnicas ou de performances – nelas, o que faz a diferença ainda é o talento humano.
Além de DJ Raylan, os grandes vencedores do 40º DMC DJ World Championships foram DJ Aociz, da França, campeão na categoria Scratch; DJ Beastmode, da Austrália, campeão na categoria Open; e DJ Fummy, do Japão, campeão na categoria Classic.

O evento contou, ainda, com eletrizantes exibições dos DJs Ta-shi, DJ Rena, DJ Kentaro, DJ Coco e DJ Kireek (Japão), JFB (Reino Unido), DJ Fly (França), Skratch Bastid (Canadá) e do coletivo Invisibl Skratch Pikzl (EUA). Considerado ícone mundial pela própria organização do DMC, DJ Babu, do grupo Dilated Peoples e do coletivo de DJs Beat Junkies, reverenciou a participação brasileira. “Adoro o calor humano dos brasileiros. Vocês transformam qualquer situação banal em uma festa contagiante”, elogiou o DJ, que já se apresentou no Brasil e disse que pretende retornar ao país.
Uma das maiores referências do mundo na arte da discotecagem, DJ Babu também jogou confete nos DJs brasileiros. “Erick Jay é muito criativo e preciso, suas performances sempre me impressionaram”, elogiou. “E DJ Raylan, que agora também é campeão mundial, é muito técnico e focado. Mesmo tão jovem, demonstra ter muita maturidade e personalidade. Ele é o presente e o futuro da discotecagem.”
Entrevista com o campeão mundial DJ Raylan
Em entrevista exclusiva ao BF, DJ Raylan conta um pouco sobre sua trajetória, dá dicas para iniciantes na arte e reflete sobre o momento – e o futuro – do turntablism.

Bocada Forte: É verdade que você começou a praticar quando ainda era criança?
DJ Raylan: Sim… meu primeiro contato com os toca-discos se deu aos seis anos de idade, por influência do meu pai, que discotecava em alguns eventos e tinha equipamentos em casa. Ele viu meu interesse, me incentivou e me ensinou os primeiros passos. Logo, ele me colocou no curso de DJs ministrado pela DJ Lisa Bueno. Depois que eu fiz os cursos básico, intermediário e avançado, a Lisa me introduziu ao Erick Jay quando eu tinha nove anos e comecei a fazer treinos específicos para batalhas. Com 10 anos, participei do meu primeiro campeonato e não parei mais.
BF: A quem você agradece e dedica este título mundial?
DJ Raylan: Primeiramente, agradeço a Deus, Ele sabe de todas as coisas e é o Senhor do tempo. Agradeço muito ao meu pai Rogério, que sempre me apoiou comprando equipamentos ou dando dicas de vida e de carreira; e à minha mãe Laiane, que sempre me apoiou e acreditou, além de meus outros familiares. Também agradeço e dedico esse título à DJ Lisa Bueno, que acreditou em mim desde o início e me ensinou os fundamentos básicos, e ao Erick Jay, por todo o incentivo, motivação e ensinamentos. Por fim, também agradeço e dedico essa conquista a todos que torceram pelo time brasileiro e a todos os DJs do Brasil.
BF: Mesmo sendo ainda muito jovem, você já é uma referência e certamente vai inspirar mais crianças ou adolescentes à prática do turntablism. Que dicas você pode dar para quem também deseja, um dia, se tornar um campeão de alto nível?
DJ Raylan: Uma dica que me ajuda muito é assistir a muitos vídeos de todos os tipos de batalha, sejam clássicos, antigos ou novos. Também é essencial consumir rotinas, produções, músicas de outros DJs… porque, se você cria um repertório, tem um armazenamento melhor do que pode ser usado em uma performance, tem material para estudar diferentes formas de usar um timbre, um beat. A pesquisa musical é muito importante, e eu costumo mencionar como fontes algumas plataformas, como Beatport e Soundcloud. Até o YouTube tem bastante coisa, inclusive tutoriais muito bons para aprimorar a técnica. Grande parte da minha evolução se deu com esses vídeos, graças a eles consegui adquirir bastante conhecimento e me aprimorar em técnicas avançadas.
BF: Erick Jay foi cinco vezes campeão mundial e, mesmo assim, o reconhecimento a essa arte ainda é tímido no Brasil, além de que mesmo DJs de alto nível, como você e o Shinpa, têm pouco apoio e enfrentam muitas dificuldades para competir fora do país. Você consegue ser otimista com relação ao futuro do turntablism no Brasil?
DJ Raylan: Diante das dificuldades e desigualdades que há no nosso país, a gente tem que correr em dobro, mas isso faz a satisfação do êxito se tornar mais gratificante. Tenho o desejo de contribuir para ver o Brasil se tornar uma potência mundial no turntablism, algo que o Erick também fez e ainda faz. Então, espero que ainda venham muitos campeonatos, mais conquistas e coisas boas para o nosso país. A gente merece!

BF: O DMC celebrou neste ano seu 40º aniversário e, mesmo com grandes avanços tecnológicos, a valorização do talento humano ainda persiste. Como você imagina o turntablism daqui a 40 anos? Será que essa arte vai resistir até lá ou será que teremos batalhas entre robôs-DJs, por exemplo?
DJ Raylan: Essa pauta é muito interessante. Na minha opinião, a profissão de DJ não vai ser substituída porque vai muito além da parte técnica, da mixagem perfeita. Tocar é muito mais sobre feeling, a emoção que só o ser humano consegue sentir e transmitir na pista. Saber colocar a música certa no momento certo, por exemplo, acho que isso um robô não consegue reproduzir. No real conceito de arte, acho que o robô não vai conseguir reproduzir isso, mesmo com as maiores tecnologias, inclusive as que ainda estão por vir.
Acho que, no futuro, pode até haver a possibilidade de batalhas entre robôs, mas creio que não vai ter o lance da originalidade, do sentimento que a arte exige. Pelo lado comercial, isso pode acontecer, tem a possibilidade de uso da IA [inteligência artificial], mas sem sentimento, sem feeling, que são coisas humanas. Até já existe uma IA que, durante o set, recomenda a próxima música a ser tocada. Mas isso foge do lance de ter um repertório na cabeça, fruto de pesquisa, de envolvimento, de conhecer a história por trás, algo que eu considero o lado mais legal da discotecagem. Então, acredito que a máquina não vai substituir isso.

Por fim, DJ Babu também fez uma reflexão sobre o futuro do turntablism:
“Creio que o turntablism não vai acabar. Precisamos nos adaptar e aprender a usar a tecnologia em favor da nossa arte, como já houve mudanças e novas ferramentas nesses 40 anos de DMC. Mas a essência do talento humano continua a mesma. Música não é só técnica. Mais que isso, é sentimento, emoção, e as máquinas só fazem cálculos matemáticos, elas não têm alma nem a sensibilidade que toda boa arte exige. Por exemplo, se você der uma mesma ferramenta avançada de IA para um humano e um robô produzirem música, certamente a música feita pelo humano será mais autêntica, terá mais vida, ficará melhor. Talvez até haja batalhas entre robôs daqui a 40 anos, mas acredito que o turntablism humano nunca vai deixar de existir.” (DJ Babu)
Assista à final entre DJ Raylan (Brasil) x DJ K-Swizz (Nova Zelândia)




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