Opinião | A imposição das redes sociais molda parte do Rap contemporâneo

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Prestes a fazer 25 anos, o Bocada Forte sobrevive num cenário onde a realidade das redes sociais é tratada como algo dado, porém mutável apenas para as empresas detentoras dos algoritmos. Questionar o atual modo de vida individualista e espetacularizado tornou-se um ato que desafia não apenas as normas vigentes, mas também as percepções da sociedade contemporânea. A crítica a esse panorama é muitas vezes desdenhada, rotulada como inocente e proveniente de mentes atrasadas e ignorantes (os famosos guardinhas e rancorosos). A mensagem “velada” é: seguir o fluxo estabelecido pelos donos das plataformas digitais e redes sociais ou, no máximo, criar uma rebeldia controlada e, crucialmente, monetizável dentro desse fluxo.

O capitalismo, em sua forma neoliberal, tem desempenhado um papel central na configuração desse novo modo de vida. O individualismo, antes considerado uma característica intrínseca do sistema, atingiu novos patamares com a ascensão das redes sociais. O culto à imagem pessoal, a busca incessante por validação e a transformação de experiências cotidianas em espetáculos virtuais são reflexos diretos dessa dinâmica. Os algoritmos, controlados por poucos, de um lado moldam a realidade que é apresentada a cada usuário, criando uma bolha personalizada que reforça visões de mundo preexistentes e limita a diversidade de perspectivas, de outro limitam criadores de conteüdo e artistas que, por medo de cancelamento e perda de seguidores, praticam cada vez mais a autocensura.

Ouça a música do Costa Alves, que no auge da pandemia já versava sobre o tema

A imposição do espetáculo nas redes sociais não é apenas uma consequência do capitalismo, mas também uma ferramenta de perpetuação do status quo. A crítica, muitas vezes marginalizada, emerge como uma tentativa de desvendar as engrenagens que movem essa máquina. A ideia de rebeldia, porém, é cooptada e transformada em um produto consumível, uma revolta de fachada que, no fim das contas, serve aos interesses dos que detêm o controle.

Para a ala politizada e militante do Hip-Hop e cada um dos seus elementos, repensar o nosso relacionamento com as redes sociais e questionar as estruturas que as sustentam é fundamental. A busca por uma nova narrativa, menos centrada no espetáculo e no individualismo exacerbado, torna-se essencial para construir um ambiente digital mais saudável e inclusivo. O enfrentamento do capitalismo e do neoliberalismo, que permeiam as bases desse modelo, exige uma reflexão crítica e ações que busquem subverter as lógicas estabelecidas.

O debate sobre o papel das redes sociais na sociedade contemporânea- na qual o Hip-Hop está inserido- transcende as discussões superficiais sobre likes, views e compartilhamentos. Estamos diante de um desafio que nos convoca a repensar não apenas nossos comportamentos online, mas também os fundamentos do sistema que molda essas interações e como a cultura de rua se desenvolveu em meio aos grupos historicamente excluídos . O futuro das redes sociais e, por extensão, da sociedade, dependerá da capacidade de questionarmos e transformarmos as estruturas que atualmente definem nosso modo de vida digital. O Rap e o Hip-Hop não podem subestimar essa discussão.

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