O que ouvimos em 2025: ‘Práxis’, Mascote
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Longe dos holofotes do hype e das métricas dos algoritmos, Práxis começa como um diário rimado. É no chiado do vinil que o disco de Mascote, em parceria com Digamanybeats, apresenta a rotina exaustiva do trabalhador periférico. Entre ônibus e metrô lotados, engarrafamentos sem fim, a preocupação com a ida e a volta para seu lar, sua família é retrato coletivo de uma classe atravessada por exploração, cansaço e um sistema que insiste em desgastar até a última gota de energia.
Não há como não ligar Práxis ao atual contexto social e político, onde a frase “Congresso inimigo do povo” invade as redes socias e faz parte do debate desenvolvido por parte dos habitantes das periferias brasileiras.
Movimentos sociais, centrais sindicais e partidos políticos estão se unindo em uma mobilização significativa, chamada de Plebiscito Popular, que começou em 1º de julho e vai até 7 de setembro em todo o Brasil. O objetivo é coletar a opinião da população sobre questões cruciais que estão sendo debatidas no Congresso, como o fim da jornada de trabalho 6×1 e a proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, enquanto aqueles que recebem mais de R$ 50 mil pagariam mais impostos. Essa iniciativa visa pressionar os parlamentares a priorizar essas pautas, que têm o potencial de beneficiar a maioria da população, mas que enfrentam resistência no legislativo.
Mascote não se posiciona como herói, o artista é parte de um cotidiano atravessado por injustiças. “Preço é um roubo, eu acuso, suas desculpas eu recuso”, dispara Mattenie em sua participação na faixa “Mão invisível”, track que aponta a naturalização da desigualdade. No clima instrumental criado para que o ouvinte preste atenção nas histórias de Mascote, o precariado, a uberização das relações de trabalho, a desvalorização dos salários e o cinismo das promessas neoliberais estão no alvo da lírica imposta em Práxis.
Sem batida e com loops hipnóticos, o rapper relata seu corre, o nosso corre. Práxis é protesto anticapitalista sem o glamour que habita nas páginas de rap nas mídias sociais que só discutem temas sérios por meio do discurso de rappers que estão no hype. Mas a luta nas ruas, aquela do cidadão tirado pelos “vencedores” e chamado de mero pagador de aluguel, tem seus representantes.
Dados de pesquisas recentes revelam um forte apoio popular para essas propostas do movimento pelo Plebiscito Popular. Um levantamento da Nexus mostrou que a maioria dos brasileiros, independentemente da faixa etária, é favorável ao fim da jornada 6×1, com 76% de aprovação entre os jovens de 16 a 24 anos. Além disso, uma pesquisa do Datafolha indicou que 70% dos entrevistados apoiam a nova faixa de isenção do Imposto de Renda. Esses números demonstram que as demandas populares estão alinhadas com a necessidade de uma reforma que traga mais justiça social e equidade fiscal.
As frustações, divagações e crises de meia idade de Mascote, também são críticas ao sistema neoliberal adorado pela direta e pelos coaches e influencers que vendem seus cursos e divulgam bets em meio aos sinais do mercado.
Repetições de batidas, repetições de batalhas, repetições de palavras (“crises, crises, crises”) funcionam como foices e martelos sonoros, enquanto as metáforas de Práxis traduzem a sensação constante de ameaça, competição e sobrevivência.
Conheci Mascote há mili anos, no laboratório do produtor Munhoz, o Professor M.Stereo, o mano era integrante do grupo Contra Fluxo, que além do professor, tinha Dejavu, Ogi e os DJs Willian e Big Edy. Coerente com sua correria e sem aderir às fórmulas da indústria musical, Mascote, em Práxis, constrói sua verdade a partir da luta diária e da construção do sustento, mas não é só isso, o artista também narra a ideia e o processo da gravação de um disco, uma criação num cenário que exige submissão estética e abandono da crítica. Disco para ouvir, pensar e repensar.
Todos nós sabemos,a música e a arte têm o poder de mobilizar e conscientizar, e é essencial que os artistas e a comunidade do hip hop na resistência e na luta por um Brasil mais justo, beats, cortes, colagens e rimas são parte intrínseca da identidade do rap. A participação popular deve ser refletida nas letras e ações do que fazem parte do hip hop combativo. Práxis não representa um esforço isolado, a união de forças entre diferentes grupos sociais que atuam nas quebradas é fundamental para amplificar a voz da população e pressionar os governantes a atenderem suas demandas. Aperte o play.




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