Referência no final dos anos 90, ‘O Livro Vermelho do Hip-Hop’ é remasterizado por Spensy Pimentel
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O livro “O Livro Vermelho do Hip-Hop”, de Spensy Pimentel, originalmente escrito em 1997 e remasterizado em 2025, pelas editoras GLAC edições e Autonomia Literária, é um documento histórico que traça a origem e a força política do Hip-Hop nos EUA e no Brasil.
Durante muito tempo, a obra foi uma das poucas referências sobre a cultura e o movimento político das periferias no final da década de 1990. Estudantes, pesquisadores, artistas, comunicadores, programadores e locutores de rádios comunitárias divulgaram os escritos do Livro Vermelho em seus trabalhos. Num cenário pré-internet, cópias do livro eram compartilhadas de mão em mão.

A pesquisa de Spensy Pimentel, um apaixonado pelo Hip-Hop desde a infância, foi publicada online em 1999 no site Bocada Forte e, posteriormente, em livro em 2025. Com fio condutor cultural e político, que representa o contexto do Rap combatente em que foi criado, a obra explora as raízes do Hip-Hop, conectando-o ao black power, ao soul, ao funk, às tradições orais africanas e às lutas por direitos civis e contra o racismo e o capitalismo, analisando sua evolução estética e política ao longo de décadas, incluindo o surgimento do Rap indígena. A remasterização de 2025 atualiza referências e inclui reflexões sobre o contexto histórico atual, marcado pelo avanço do fascismo e a necessidade de recordar as raízes do movimento.
Spensy, que também colaborou efetivamente com o Bocada Forte, fazendo traduções dos escritos de Mumia Abu Jamal, tecendo ligações com a mídia independente mexicana, entre outras articulações com a Teia dos Povos, explora as origens do Hip-Hop nos guetos negros de Nova York na década de 1970, contextualizando-o no cenário de segregação racial, pobreza e violência, e relacionando-o ao black power, ao soul e ao funk. Analisa as figuras de Malcolm X e Martin Luther King, o Black Panther Party, e a repressão sofrida pelos ativistas negros.

Sem perder de vista o contexto de desigualdade social, Spensy Pimentel discute as raízes musicais do Hip-Hop, além de abordar o Graffiti e o Breaking como elementos fundamentais da cultura. O autor analisa a relação entre o Hip-Hop e a política, incluindo o envolvimento de artistas com partidos de esquerda no Brasil e a criação das posses.
Spensy examina a globalização do Hip-Hop, sua disseminação por diferentes países e culturas, e a adaptação do movimento a contextos locais. Analisa a persistência do espírito de revolta e resistência em diversas manifestações do Hip-Hop global, incluindo o Rap indígena na América Latina e em outros países. Discute a relação entre o Hip-Hop e as lutas por terra e território, especialmente entre os povos indígenas. Sua escrita anticapitalista tem na mira a relação entre o neoliberalismo e as redes sociais no Hip-Hop brasileiro contemporâneo, que se revezam entre aceitar a ordem imposta e buscar novas formas de combate.
Rap indígena e quilombola como luta ancestral e reencantamento do Hip-Hop
Um dos pontos centrais da edição remasterizada é a atenção ao Rap indígena. O autor mostra como grupos e artistas utilizam suas línguas nativas para denunciar violências históricas, afirmar identidades e lutar por terra e território.
O livro cita exemplos no Chile (Luhanko e os Mapuche), na Bolívia (Wayna Rap), nos EUA (Supaman e Drezus), no Havaí (Sudden Rush) e no Brasil, onde o movimento ganhou força com o Brô MC’s, seguido por nomes como Oz Guarani, Xondaro MCs, Owerá e Kunumi MC.
Pimentel destaca que o Rap indígena e quilombola representam um reencontro do Hip-Hop com suas raízes ancestrais, aproximando o movimento das lutas históricas contra o colonialismo, a escravidão e o capitalismo.
“O Livro Vermelho do Hip-Hop” reafirma que a cultura não pode ser compreendida apenas como entretenimento ou mercadoria. O movimento político dentro da cena não pode ser ignorado e ofuscado pelos grandes festivais e pelas playlists das plataformas digitais. O Hip-Hop não cabe em carrosséis de mídia social.
Nossa cultura é, antes de tudo, ferramenta política, forjada nas periferias e cheia de contradições. A remasterização da obra registra nossa luta atual diante dos novos e velhos inimigos: o racismo, o capitalismo e o fascismo.





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