Dani Pimenta: ‘Temos uma responsabilidade social enquanto mulheres atuantes no sound system’

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Dani Pimenta é seletora desde 2012, mas sua história como DJ e produtora começou um pouco antes. A responsável por projetos importantes para cena reggae, como o Feminine Hi-Fi, o blog Groovin Mood, a Feira de Discos de Reggae e Mapa Sound System Brasil começou escrevendo em meados do ano 2005. Dani já foi colaboradora do Bocada Forte.

Naquela época, eu frequentava as festas de rap. Eu ia no Class, Blem Blem, Brancaleone, só que sempre estava flertando com outras sonoridades. Em 2006, eu comecei a colar no Java, uma festa do Dubversão que tem aqui em São Paulo. Na época, era na rua Augusta. Alí foi uma abertura de portal. Quando eu conheci estas faces do reggae, eu me apaixonei completamente”, recorda a seletora.

Dani, também conhecida como Dani I-Pisces, começou a trabalhar com o reggae por meio da escrita. A produtora criou um blog em 2008, o Groovin Mood, que está no ar até hoje. Mas tudo ao seu redor conspirava para que a blogueira começasse sua experiência no mundo dos toca-discos. “Alguns amigos meus diziam que eu tinha que tocar, pois comecei a comprar uns discos, ganhar outros.”

Foi em 2011, após uma conversa com Andrea Lovesteady- DJ e produtora, uma das fundadoras da Feminini Hi-Fi e colaboradora do Groovin Mood-, que as duas comunicadoras do reggae resolveram fazer uma festa com o mesmo nome do blog. A festa rolou em 2012.

“Eu nem sabia colocar os discos direito, mas eu queria fazer alguma coisa nesse sentido. A festa foi um sucesso. Rolou no Prato do Dia, evento realizado na praça Roosevelt. Acho evento nem chamava Prato do Dia ainda. Tinha outro nome, outro rolê. A Groovin Mood encheu a Roosevelt, foi muito louco”, relembra. A festa do blog teve três edições, incluindo a celebração de cinco anos do Groovin Mood.

Andrea e Dani não pararam. Juntas, as seletoras fizeram várias festas e, de alguma forma, sempre conectaram o trabalho das mulheres do reggae e da discotecagem. “Homens tocaram em nossas festas, mas procuramos trabalhar mais com as minas, desde o começo”, afirma Dani.

Dani Pimenta. Foto: Erica Bastos

Continuando sua saga no mundo da discotecagem. Dani, junto com outras amigas, criou uma festa chamada Mulherio Festival, o ano era 2014.

“Não tocávamos só reggae, mas esse foi o primeiro rolê que eu fiz que só tinha mina. DJ, produtora, fotógrafa, caixa, todas mulheres. A gente fazia palestra, bate-papo, rango, bazar. Era um mini-festival mesmo. Rolavam várias atividades. Tinha cantinho para crianças. Tinha mina cortando o cabelo…”

Dani ficou na Mulherio durante um ano e meio. “Sabe quando você entra naquela crise existencial? Então…eu não sabia mais se queria tocar, não sabia se ainda queria fazer festa”, recorda a seletora. A Mulherio continuou por mais um tempo, mas acabou morrendo.

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DOMINANDO A SELEÇÃO

“A gente tinha poucas oportunidades para tocar. A gente tocava quando estava produzindo alguma coisa ou quando era macho que chamava a gente pra tocar…você sabe qual a intenção. Isso sempre foi um incômodo. A gente não queria esperar chegar o mês de março (nas comemorações do Dia Internacional da Mulher)”, diz Dani.

A reação a isso tudo veio no começo de 2016, com uma festa que, além das seletoras do Groovin Mood, incluiu outras mulheres. As minas não iam mais esperar que os manos fizessem uma festa e as convidassem para tocar.

Dani criou um grupo no Facebook e convocou a cantora Layla Arruda; sua parceira de outras festas, Andrea Lovesteady e Renata, conhecida na cena como Rude Mama, uma das seletoras da primeira safra de São Paulo.

Foi Rude Mama quem deu a ideia de fazer a festa em formato sound system. Dani decidiu que a festa deveria ser na rua. Nascia a Feminine Hi-Fi.

“Sempre foi difícil para nós mulheres em qualquer lugar. Na música brasileira a gente tem um espaço um pouco maior. No reggae não era bem assim. A cultura sound system, onde a gente atua, é muito masculina. É só homem, homem, homem. Quando a gente começou a falar da Feminine, virou uma coisa sem controle. Havia uma demanda muito reprimida. Antes que a gente transformasse a Feminine num projeto, transformaram nossa proposta em um projeto. Antes de rolar a primeira festa, a galera já estava perguntando quando seria a próxima ”, afirma a seletora.

Dani também afirma que muitas DJs, MCs e cantoras- que pensavam em parar com suas carreiras – seguiram em frente a partir do convite para apresentações feito pelas integrantes do Feminine Hi-Fi.

Dani Pimenta. Foto: Erica Bastos

NA RUA, O RESPEITO À QUEBRADA

Em 2016, Feminine Hi-Fi estreou na CDHU Voith, no bairro do Jaraguá. “A Renata (Rude Mama) mora lá. Tem também a questão do sound system ser uma movimentação da quebrada. A gente não via sentido em começar em outro lugar. A gente transita em outros lugares, mas a gente vem desse rolê”, conclui a produtora.

Em um ano, foram quatro edições da Femini Hi-Fi, três delas na Voith. Para facilitar o acesso dos fãs de reggae e suas vertentes, a outra edição da festa, realizada no Largo da Batata, em Pinheiros, lotou o local com pessoas dos quatro cantos da cidade.

O resultado do trabalho das seletoras veio com o tempo. A Feminine Hi-Fi invadiu o circuito Sesc, marcou presença na Virada Cultural de São Paulo. Convites chegaram de todos os lados e as mulheres produtoras levaram a cultura soundsystem para diferentes cidades.

Chegou o ano de 2018, e as minas trouxeram a cantora jamaicana Jah9, um dos ícones do reggae revival. Elas também foram para a Europa, realizando uma turnê de dois meses e passando por um total de seis países (Alemanha, França, Itália, Suíça, Reino Unido e Espanha) e 12 cidades.

ETERNO RETORNO

Em 2020, A Feminine Hi-Fi planeja um retorno às suas origens, com eventos nas quebradas e oficinas. “Não vamos deixar de fazer as outras paradas, mas a ideia é voltar a fazer mais eventos como a gente fazia antes”, diz Dani. “Festa de rua fica mais difícil com o cenário político atual, mas pretendemos fazer junto com a comunidade”.

Vendo sua caminhada pelo retrovisor, a DJ e produtora fala sobre a construção da identidade das minas na discotecagem e a representatividade feminina.

“A gente quer um espaço, mas a gente quer espaço para as outras minas também. Pouco adianta as integrantes da Feminine Hi-Fi terem espaço e as outras minas não terem. A gente tem uma responsabilidade social enquanto mulheres atuantes no sound system”, conclui a DJ.

Apesar de serem destaque em diferentes mídias e sites descolados. As minas não estão no bonde dos deslumbrados. “Em 2020 queremos ser menos artistas e mais um espaço para as outras minas”. Que assim seja.

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