Acervo Bocada Forte | Entrevista com Sharylaine, por Rapper Pirata

Essa entrevista foi publicada em maio de 2001, na Revista Hip Hop na Veia Nº 15 . A Revista era do Tio Duda, parceiro de conteúdo do Bocada Forte. Não sabemos a data exata, pois a Revista era datada apenas com o mês e ano de lançamento. Última edição em 04/08/20.

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Na nossa visita ao projeto Gol de Letra tivemos o prazer de ser acompanhados por Sharylaine, considerada por muitos a primeira rapper brasileira. A Revista Hip Hop na Veia/Bocada Forte não perdeu a oportunidade e trocou uma ideia com essa verdadeira lenda do Rap nacional.

Sharyline na Rima
Por Rapper Pirata – Maio/2001

A mulher está com dezessete anos de Hip Hop, a mesma idade que ingressou na cultura. Ela amadureceu o bastante para dar um doce sabor nas suas letras e impor respeito.

No passado para ser respeitada teve que se vestir como os homens da época, mas sempre dando um toque feminino, colocando vestimentas rosas, o que chegou a lhe reder o apelido de ‘Pantera Cor de Rosa’, tudo para ser respeitada como profissional no meio.

Hoje critica as mulheres que curtem Hip Hop só para estarem perto de seus ídolos, desconhecendo o poder que tem em suas mãos. Também fala de revolução tecnológica, algo que muitos nem sabem que existe. O nome dessa fera é Sharylaine, umas das pioneiras do Rap feminino no Brasil. Nesta entrevista ela demonstrou que a atitude é muito importante, desde que seja consciente, para não se cair em contradição no futuro.

Ouça a apresentação de Sharylaine no Estúdio Show Livre

Hip Hop na Veia – Por que você resolveu participar do Hip Hop?
Sharylaine – Foi na adolescência. Quando você começa a descobrir as coisas que acontecem fora do universo do seu bairro.

Hip Hop na Veia -Quantos anos você tinha?
Sharylaine – Dezessete. O primeiro contato que tive com o Hip Hop foi através da Nação Zulu, uma da gangues pioneiras do Hip Hop. O primeiro Rap que ouvi se chamava “Rap revelação” e quem cantava era o Marrom, que é um dos integrantes da Zulu. Eu comecei a cantar ao lado da rapper City Lee, tínhamos um grupo o Rap Girls, só que, em 89 ela parou e eu continuei. Em 1990 saí na coletânea da Zimbabwe, ‘Consciência Black’, e em 92 fiz a regravação da música que saiu na coletânea ‘Rappers e Irmãos’. Dentro dos meus trabalhos independentes, gravei uma música, “É Saudade” pra Kaskatas.

Ouça uma das primeiras gravações das Rap Girls

Hip Hop na Veia – Quais as dificuldades que você teve na época?
Sharylaine – A primeira é ser mulher no Hip Hop, que é um movimento masculino. Então eu andava como eles, só que usava rosa, enquanto eles usavam preto, acabei ficando com o apelido de Pantera Cor de Rosa. Eu precisava ser respeitada, não dava pra ser tão feminina entre eles, sem que me olhassem como uma pessoa profissional, como uma integrante que pensa. A questão é sexual mesmo: você olha para uma mulher e vê uma pessoal inteligente, você olha e vê a questão sexual, aquilo que está oferecendo aos seus olhos. Aí, eu consegui driblar isso, me vestindo como eles, mas procurando tons para dizer: olha eu sou mulher, sou uma entre vocês!

Hip Hop na Veia – Você defendia as mulheres?
Sharylaine – Não. Porque eu já comecei politizada, entendeu? Comecei falando de política mesmo, sem pensar a questão da mulher. Porque é muito vago você ser mulher e falar a sua questão, parece que o mundo só gira em torno de você.

Ouça a primeira gravação em carreira solo

Hip Hop na Veia – O que é ser mulher brasileira?
Sharylaine – Ser mulher brasileira é complicado, porque nós somos a maioria da população e não estamos em maioria no poder, dentro da cultura, da política, dos programas, porque continuamos cuidando das nossas casas, criando nossos filhos e muitas vezes só.

Hip Hop na Veia – Você acha que as mulheres que estão no Hip Hop têm ideologia?
Sharylaine – Eu acho difícil, porque as vezes vejo muitas meninas dentro do Hip Hop somente para se aproximarem de seus ídolos. Elas não vêm com aquela coisa, que eu posso produzir, posso se envolver com os conflitos dentro do Hip Hop, né? Então, estão lá pelo ídolo, mas não sabem nada, não tem aquela simpatia pela cultura.

Hip Hop na Veia – O que falta nos grupos que estão fazendo músicas?
Sharylaine – Na minha visão, é o seguinte, falta expressão.

Hip Hop na Veia – Qual é essa expressão?
Sharylaine – Vou dar um exemplo – têm grupos masculinos que colocam uma ou duas mulheres, elas aparecem no momento que entra as suas vozes, depois é como se não existissem no palco, os homens tomam conta do cenário.

Assista ao vídeo da música “Sou jovem

Hip Hop na Veia – Não se preocupam como as integrantes dos grupos?
Sharylaine – É. Se organizarem festas, levam um grupo de mulher, para dizer que tem um grupo feminino no show.

Hip Hop na Veia – Você acha que elas têm medo de se expressarem e não serem aceitas?
Sharylaine – Não. Eu acho que elas não sabem o poder que têm.

Hip Hop na Veia – Se forem questionadoras da sociedade do ponto de vista que acham certo, poderiam passar por cima desta imagem?
Sharylaine – Se elas tiverem atitude, porque a mulher é discriminada uma vez mais que o negro, o pobre, por ser mulher. Então, elas têm que ser 100% atitude, postura. Tem que fazer a letra. Tem que ser tudo.

Assista Laine ao vivo cantando a música “Poderosa”

Hip Hop na Veia – A Sharylaine é?
Sharylaine – Eu acho que estou chegando perto, porque a experiência vai ajudando. Hoje penso o que as pessoas precisam, antes era o que eu acho.

Hip Hop na Veia – Você tem medo de competir com os homens que fazem o Hip Hop?
Sharylaine – Eu não! As mulheres do movimento deveriam estar mais integradas, mas mulher é um bicho difícil.

Hip Hop na Veia – Falta união?
Sharylaine – Falta, tem gente que em vez de chamar homens pra rimar, poderia me chamar, eu aceitaria o convite. Já que diz que se se inspirou em mim.

Hip Hop na Veia – O que você faz atualmente no Hip Hop?
Sharylaine – Acompanho o Fator Ético.

Ouça a música “Saudade”

Hip Hop na Veia – Como pintou o convite?
Sharylaine – Eles estavam fazendo alguns shows e me ligaram: “Pô Laine, você não está fazendo nada, vamos pros shows com a gente…”. Aí, eu ficava de roadie (assistente técnico), falava: “Ah! Abaixo o som, aumenta os microfones…” Os acompanhei nas gravações, eles pediram para eu participar de uma faixa, aí falaram que iam prensar o CD…

Hip Hop na Veia – O que você acha do novo público do Hip Hop?
Sharylaine – Olha, acho um público fraco de escolha, porque na minha época a gente escolhia o que queríamos.

Hip Hop na Veia – O que você acha das pessoas que se dizem linha de frente do Hip Hop?
Sharylaine – Eu acho que eles não acompanharam o crescimento.

Hip Hop na Veia – Mas eu estou falando do pessoal que tem o sucesso?
Sharylaine – Justamente, é isso que estou falando. O Hip Hop não tem uma cartilha, correto? A gente presa a liberdade de expressão? Depois a gente vai falar sobre revolução tecnológica, aí, alguém diz: “Olha! A parada aí de revolução tecnológica, não está com nada”. Só que, ele anda de celular e cai em contradição, já que não faz parte dela, então joga o aparelho fora e desliga o computador.

Confira Sharylaine com o grupo Fator Ético

Hip Hop na Veia – Qual é o problema da revolução tecnológica?
Sharylaine – A revolução é um problema, né? Só que a periferia precisa de informação, ela necessita saber que faz parte dessa revolução. Ela acha que está distante dela, isso é mentira, a partir do momento que alguém vai ao banco sacar no caixa eletrônico já faz parte.

Hip Hop na Veia – Você acha que esta revolução favoreceu a cultura?
Sharylaine – Muito.

Hip Hop na Veia – É um bem?
Sharylaine – É um bem super importante, porque está ligando a gente, temos que aprender a usá-la.

Ouça a mixtape Especial Mulheres no Rap – Anos 90

Hip Hop na Veia – Quais são os planos da Sharylaine no Hip Hop?
Sharylaine – Este ano acompanho o Fator Ético. Começo a fazer um projeto de gravar nos próximos anos, mas com calma. Eu quero é fazer música de qualidade, e sou de me policiar para não cair em contradição, né? É um trabalho para longo prazo, agora estou pensando em fazer uma enquete para saber o que as pessoas estão precisando.

Hip Hop na Veia – Isso não pode prejudicar as sua composições? Você vai se distanciar de sua realidade, para fazer músicas de determinado problema que não tem nada haver com você?
Sharylaine – Não, ai é que está… A gente tem muitos problemas, acho que está na hora do Hip Hop pensar nas soluções dos problemas.

(11)6991-1107
(11)9844-9280
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Assista ao vídeo da música “Livre no Mundo”

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