Como assunto é o “Pretérito”, terceiro disco do grupo Ca.Gê.Be (Cada Gênio do Beco), vamos começar com esse som ai em cima, pois ele representa o pretérito do grupo. Essa foi a participação deles na música “O começo do fim” do grupo O Vírus, projeto do MC Diwcy (Vitima Fatal).
A formação não era a mesma de hoje, mas a essência do grupo se manteve, rimar “como se fosse o mundo visto por quem tá no beco”, como eles mesmos disseram em entrevista ao BF após lançarem o primeiro disco, “Lado Beco”, em janeiro de 2007 – o álbum havia sido lançado em novembro de 2006.
Continuando no pretérito, tá vendo esse release aí do lado (ou acima)? Foi assim que chegou pra gente o aviso de lançamento do disco, por meio da Tatiana Ivanovici, que estava fazendo a assessoria para o selo Equilíbrio do DJ KL Jay, responsável por esse lançamento e também do grupo Relatos da Invasão.
Elxs conseguiram lançar o primeiro trabalho 6 anos depois do grupo ser formado. São só algumas lembranças pra entrar no clima do álbum, que em toda a estética visual e musical remete ao passado.
A imagem da capa, feita por Rafael Mendes, remete aos gibis e/ou revistas de histórias em quadrinhos, inclusive a forma que o valor, que é apenas simbólico, foi colocado. A força e a garra das mulheres está ali também, representada por Shirley Casa Verde, a “Dona do Game”, como diz Cezar Sotaque na música “1998”, e realmente ela foi muito mais presente “Lado Beco”.
DJ Paulinho completa a formação atual, que na verdade já vem assim desde o disco ‘O Vilarejo’ (2010). Boa parte das músicas de “Pretérito” já vinham sendo lançadas há alguns anos, algumas até com vídeos que vocês poderão conferir aqui.
Assista ao vídeo da música “Nota zero e meio”
Falar de discos como esse é também voltar as raízes do Bocada Forte, que surgiu em 1999 para divulgar o trabalho de um grupo do extremo sul de São Paulo, o Urbanos MCs (Reg’D, Canibal, Dindom e DJ Nando). De um grupo, isso se expandiu para grupos de todo Brasil, exterior e todos os elementos da Cultura Hip Hop, está no nosso DNA. (abaixo o primeiro vídeo filmado, editado e produzido pelo Bocada Forte)
Assista o vídeo do Urbanos MCs (part. Gueto Z/O)
Cezar, Shirley e DJ Paulinho não fazem parte de nenhuma das “panelas” do Rap, são legítimos representantes do Rap periférico do lado norte de São Paulo. De onde, como eles afirmam na música, nasceu “Jesus negrão”, agora ‘Big Black Jesus’, camisa 9, vivendo na Inglaterra. É isso mesmo, o disco tem uma música inspirada no jogador Gabriel Jesus, cria da quebrada.
Assista o vídeo da música “Sargento”
Tem gente que diz que grupos como o Ca.Gê.Be estão na contramão. Eu discordo, eles estão na mão certa, não vão ter os milhões de views, as curtidas, seguidores e compartilhamentos. Da mesma forma que os que alguns julgam estar na mão correta, nunca terão o reconhecimento e a credibilidade das ruas, as datas em suas agendas não privilegiam os extremos, a não ser quando é em algum SESC. Já os Gênios do Beco estão nas vielas, no escadão, nas ruas de terra, perto da caixa d’água, nos becos, nas escolas, sejam elas de samba, municipais ou estaduais, na gira, no culto, no fluxo, enfim, onde está quem realmente precisa ouvir o seu Rap.
O disco tem 15 faixas, que de pretérito tem pouco, os temas são atuais, alguns atemporais em nosso país, infelizmente. É mais um excelente álbum de Rap que tem o produtor Semgrana da RecLivre envolvido na produção. Não lembro a última vez que ouvi um lançamento do Rap brasileiro durante tantos dias seguidos e com prazer, em volume alto para que até os vizinhos escutassem. A afirmação do Gaspar (Z’África Brasil) na música “Tem cor age” – “não tá faltando Rap, tá faltando Rap de verdade” – vai deixando de fazer sentido aos poucos.
Durante uma semana vocês puderam acompanhar boa parte da história do grupo, através de entrevistas, vídeos, resenhas dos discos e fotos. Ouça o “Pretérito” e confira abaixo os outros conteúdos.
[+] Leia entrevista com o grupo (2019)
[+] Leia matéria sobre o disco ‘O Vilarejo’
[+] Leia entrevista com o grupo (2007)
Ouça o disco