X Câmbio Negro retorna à cena com novo clipe e troca ideia com o BF

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X em ação. Foto: Facebook do artista

Ele é considerado e respeitado como um dos maiores MCs do hip hop e da música rap nos anos 90. Conhecido por seu timbre de voz inconfundível e rimas contundentes, o rap brasileiro com certeza deve muito de sua história vitoriosa e promissora a esse artista. Estamos falando de X (ÉKS), vocalista de um dos grupos mais efusivos da cena nos anos 90, o Câmbio Negro.

Nascido em Brasília, em 5 de novembro de 1968, e morador da cidade satélite de Ceilândia, X começa a frequentar os salões de black music, como o consagrado “Quarentão”, em 1981. Então, aos 13 anos de idade se apaixona pela dança b-boying. Em 1989 funda, juntamente com o B-Boy e grafiteiro Souto, um dos mais importantes nomes da dança de rua no Brasil e no mundo: a DF Zulu Breakers. No mesmo ano, X participa do primeiro concurso de rap de Brasília, realizado na extinta “Fonte do Bom Paladar”, no Cruzeiro, sagrando-se vencedor.

Câmbio Negro, capa do DVD.

Em 1990 cria o grupo Câmbio Negro e vence o segundo concurso de rap de Brasília, realizado no “Pandiá Calógeras”, no SMU. X foi o principal vocalista do grupo de 1990 até 2000, quando a banda desfez-se. A partir daí o MC seguiu em carreira solo. No total foram cinco discos gravados. Três pelo Câmbio Negro e dois individualmente, muitos sucessos e histórias pra contar. Já faz um tempo que X anda sumido.

Agora, o rapper X está de volta com o videoclipe da música “NINGUÉM TOMA“, que tem direção de Leandro G. Moura (assista abaixo). Aproveitando a ocasião, o Bocada Forte trocou uma ideia com a fera*.

Bocada Forte (BF): É com grande alegria que todos nós do BF recebemos o lançamento do single e videoclipe “Ninguém Toma”. Conta pra gente da onde surgiu a ideia do trampo, como você idealizou o som e se vem mais coisa boa por aí…

X Câmbio Negro (X)A ideia simplesmente surgiu. Veio pra mim como um mantra. Estava passando momentos muito difíceis e a inspiração veio. Então, minha mente meio confusa, meio louca, meio conturbada, começou a trabalhar e deu no que deu. As inspirações desse novo trampo são várias, mas principalmente a auto-afirmação, auto-superação, engrandecimento do ser… Coloquei na letra o que sempre coloco: verdade e sentimento.

Vem mais coisa boa por aí. Dependendo do andamento desse videoclipe, pretendo fazer outro e lançar assim que possível, pois não tenho gravadora e nem patrocinadores (ainda). Então tudo depende.

BF: Existe a influência da fé nesse trabalho? Esse trabalho é uma busca pelas raízes? Perguntamos isso por conta de ser feito na natureza e com muita simbologia.

XPra mim, um homem sem fé não para de pé. Muita influência de fé, sim. Os Orixás me guiam, me guardam e me encaminham. Respeitos todas as religiões e a ausência delas, mesmo que algumas não respeitem o povo que veste branco e estão começando uma guerra na qual todos perdem, mas sou um homem de fé. Nunca saí de minhas raízes. Árvore sem raiz é arvore morta.

Este trabalho é um reencontro comigo mesmo. Vários foram os motivos que me fizeram ir pra “dentro de um buraco”, me entocar numa “caverna”. E nessa caverna tive tempo para meditar, para pensar no meu hoje e amanhã e para decidir a hora de sair dela e dizer que durante todos esses anos nenhuma criatura viva pôde tomar meu lugar, pois meu lugar ninguém toma! É meu por direito, foi conquistado.

A natureza demonstrada no vídeo é a que amo… Adoro pássaros cantando livres, cheiro de mato, a imensidão. Sou natural da capital do país, mas sempre serei bicho do mato.

BF: Como anda a cena da música rap no DF? Você tem acompanhado o surgimento de novos artistas do hip hop por aí?

XCara, a cena do DF é pulsante sempre. Algumas coisas boas e muita merda, como em todo lugar. Gosto de muita coisa que pra muitos pode ser novidade e pra min não. E detesto muita coisa que tem mais de um milhão de visualizações e não me diz nada. Rap pra min tem que ter conteúdo.

X. Foto: Facebook do artista

BF: A pergunta é recorrente, porque o tema sempre será. Como você vê a música rap – Brasil e no mundo – atualmente?

XVejo o rap no Brasil num momento bom. Tocando em rádios, emissoras de TV, etc . Um momento pelo qual lutamos por décadas… Mas, por outro lado, não vejo quem construiu a estrada de tijolos amarelos aparecer. Salvo em raras aparições. Vejo muitas vezes uns moleques ostentação do caralho, travestidos de rappers, ganhando a fama, mas estão apenas ganhando fama enquanto quem é de verdade tem carreira.

No mundo o rap tá se expandindo. Ouço coisas da rússia, japão, etc. O rap não para. O hip hop não para.

BF: O momento político, econômico e social vivido no Brasil é seríssimo. Em 2009 a gente fez uma entrevista contigo e tu afirmou que sem uma postura politizada da juventude estamos fadados a continuar aguentando ‘Fernandos Collor’ no poder. Hoje a gente tem um presidente corrupto, acusado de formação de quadrilha no poder, e um “super juiz”, que mais parece um acusador, perseguindo políticos de esquerda. Qual a opinião do X sobre tudo o que estamos passando? Existe uma luz no fim do túnel?

XO momento político é extremamente difícil. Vivemos uma época de expiação. O atual presidente é um canalha, certamente, mas só está lá porque erroneamente o PT fez um pacto com o diabo e se aliou a ele. Votei no Lula na primeira vez e acho que fez um bom governo. Na segunda vez, não gostei. E depois empurraram a Dilma pro povo, pra só fazer merda e tomar uma rasteira de seus “aliados”. Mas o povo tem o governo que merece. Os justos pagam pelos pecadores. Vemos hoje deputados e senadores querendo aliviar o safado por dinheiro e dizendo: “Foi Deus que mandou votar a favor do Temer!” A Câmara e o Senado em mais de 95% não me representam!

Existe, claro, luz no fim do túnel. Não votar em ficha suja! Não votar por lote, por tijolos, por dentadura ou porque vai regularizar igreja em área residencial. Na verdade a luz é a vergonha na cara! Ainda tem gente que tem.

BF: E o hip hop brasileiro com isso? Você acha que a cultura hip hop vem cumprindo bem o seu papel no jogo político/social?

XCara, vejo poucxs mas valorosxs guerreirxs do hip hop lutando por melhorias, sim. Mas um monte, que antes se dizia do hip hop até a morte, se vendeu por conta de projetos aprovados, por um cargo no governo (municipal, estadual ou federal). Na verdade, a ideologia pra muitos é o sifrão, a grana, e foda-se o resto. Eu não tenho preço! Não estou à venda. Estou aos poucos me preparando pra morrer. Quero uma vida plena após meu desencarne. Quero deixar algo de bom aos meus. Fama acaba. Dinheiro acaba. O que conta é quem você foi e o que fez.

DJ Raffa, Viela17, X (Câmbio Negro) e Marcão (Baseado nas Ruas). Foto: Facebook Viela17

BF: Em 2006, noutra conversa que você teve com o BF, você declarou: “um dos motivos de não fazer mais shows é não compactuar com o que está ai, se é isso que querem ver e ouvir passem bem“, numa crítica ao rap brasileiro produzido na época. Algo mudou no rap ou em você?

XQuero voltar a fazer shows, sim! Mas farei quando quiser, os que achar interessantes e não farei mais de quatro shows por mês. Quero tempo pra minha família e não simplesmente ganhar grana pra caralho e dar uma vida boa pra família, sem estar com ela pra compartilhar os momentos bons. Ir correndo de um show pro outro e morrer na estrada porque? Dinheiro? Vai levar no caixão? Não, obrigado.

Tenho meu emprego e com ele pago precariamente minhas contas mas às pago. Rap é meu prazer, minha satisfação. Se for pra fazer por dinheiro, apenas, é prostituição. Faço pra ganhar dinheiro pelo meu trampo, sim, mas por prazer e satisfação. As pessoas me respeitam e o mínimo que devo devolver a elas é o respeito.

Eu andei fora do cenário por vários anos, mas não quer dizer que não possa voltar a assinar com uma gravadora ou selo e tal… Tudo depende da conversa, da proposta.

Obrigado, Bocada Forte, mais uma vez pelo apoio e aos que possam se interessar. Mesmo depois de quase 20 anos sem gravar, o Meu lugar Ninguém Toma!

Assista ao videoclipe da música “Ninguém Toma”:

 


 

Ouça o álbum “Sub-Raça”, do grupo Câmbio Negro, lançado em 1993:

Ouça o álbum “Diário de um Feto”, do Câmbio Negro, lançado em 1995:

Escute o álbum “Círculo Vicioso”, lançado em 1998:

Confira a última apresentação do grupo Câmbio Negro, em 2015:

Escute o álbum “Um Homem Só”, primeiro trampo solo de X, lançado em 2001:

Ouça “Curto e Grosso”, álbum de solo de X, lançado em 2005:

[+] Assine o canal oficial de X no YouTube

*Agradecimentos especiais pela contribuição, a Def Yuri.

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