Memória BF | Em homenagem a J Dilla, a história do seu primeiro beat lançado oficialmente

Publicado pela primeira vez em 07.06.2022, última edição 06.02.2024

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Consumir música antes da existência de toda tecnologia que conhcemos hoje era muito diferente, fiquei anos com a primeira produção do Jay Dee na estante e nem sabia que era dele. Eu tenho muitos discos do Rap underground estadunidense e muitos deles eu só fui conseguir informações com a chegada da internet. Tem alguns, que mesmo com a internet, a pesquisa precisa ser aprofundada, não dá pra fazer uma simples consulta e já achar o que precisa. Clica aqui, clica ali, se cadastra em fóruns, fala com gente do mundo todo, pergunta, troca fotos, links e assim vai colhendo informação.

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Como o mês de fevereiro marca o nascimento e também a partida de James Dewitt Yancey, resolvi escrever sobre um disco que tenho há muitos anos e nunca imaginei que ali continha a primeira faixa produzida por ele que foi lançada comercialmente. Digo “comercialmente” porque com certeza ele deve ter gravado fitas demos, algo que era muito comum nos anos 80 e 90 em qualquer lugar do mundo. O disco em questão é um EP do grupo Da’Enna C ou Da Enna Cirkle, de Detroit. O grupo era formado por P.Gruv, Sleeepy D (3E), Boog-Woog, DJ Dez e três integrantes extraoficiais – Jah-Zilla, J Dilla e o irmão mais novo de P.Gruv, McShyzt.

O título do EP é ‘You Can’t Use My Pen’ e foi lançado por uma gravadora que era administrada pelo próprio P.Gruv e por seu pai, atualmente a gravadora se chama Hipnotech Records e continua em atividade. Em 2010 eles lançaram oficialmente um outro som produzido em 1994 por Jay Dee, que vou deixar aqui também.

Mas vamos a história de como foi a descoberta. Não lembro exatamente quando descobri, mas com certeza foi depois da morte do Dilla e não foi esse o motivo da minha pesquisa, foi totalmente aleatório. Como já disse, tenho alguns discos bem underground mesmo, tudo em vinil, são singles, álbuns, EPs, as capas são sem fotos, sem informações, sem encarte, só as informações do rótulo e alguns poucos que nem no rótulo tem informações e não há app que identifique as músicas, já tentei alguns.

Um adendo aqui só pra exemplificar, eu tenho uma coletânea onde saiu o primeiro lançamento oficial do Blackalicious, quando eles estiveram no Brasil consegui levar esse disco pra eles assinarem, o Gift of Gab chamou todos que vieram com ele pra mostrar o disco, porque ele não acreditava que no Brasil fosse encontrar uma cópia dessa coletânea. Essa ai merece uma matéria, pois é uma coletânea do Zine The Bomb Hip Hop, dedicado a falar do Hip Hop em geral, mas principalmente da Bay Area, então nesse álbum tem só artistas da região e nenhum ainda tinha trabalhos oficiais. Também tenho uma história pessoal sobre ele que é interessante e engraçada, qualquer dia escrevo sobre.

Abaixo a coletânea que citei

Voltando ao Dilla, vira e mexe eu pego alguns desses discos e pesquiso pra ver se encontro informações mais precisas – tem uns fóruns de Rap underground que são zica demais, os manos buscam as paradas no “pré-sal” do Rap. Esse disco em especial eu nunca havia me preocupado em procurar nada sobre ele, um dia do nada escolhi, coloquei pra tocar e fiquei lendo o rótulo e aquele ‘J.D’ acompanhado de ‘for Slum Music’ me chamou a atenção demais. Pensei “só pode ser dele” e realmente era, ou melhor, é.

Imagem digitalizada do rótulo do EP, lado A

Na época a pesquisa não foi tão fácil, mas encontrei algumas fontes que confirmavam que realmente era a primeira gravação comercial do mestre J Dilla, hoje tem muito mais informações sobre esse som e até foi relançado no ‘J Dilla Anthology Vol.06’. Claro que quando eu fiz essa descoberta muita gente já tinha conhecimento dessa música, mas pra mim foi uma surpresa ter esse EP entre esses discos ‘desconhecidos’. Uma curiosidade, que pra quem é fã dele não é nenhuma novidade, mas esse J.D naquele momento era de John Doe. Waajeed, amigo de JD, fez até uma exposição de fotos com o título ‘A Day in the Life of John Doe’.

Ouça a faixa produzida por Dilla

Esse EP tem 4 faixas – “You can’t use my pen”, “Throw ya hands in da’ air”, “Da’ pen song” e a faixa produzida por Jilla é a “NOW”. E ai quando você pensa que a descoberta para por ai, vem a parte do sample e como é maravilhoso ainda ouvir músicas em vinil. Jay usou nesse som a faixa “Who is she (And what is she to you)” de Gladys Knight & the Pips (1973) do álbum ‘Neither One Of Us’ lançado no Brasil pela Tapecar. E ai eu penso “tenho quase certeza que eu tenho esse álbum com o sample que ele usou”, lá vai eu fuçar nos discos dos anos 70 e tá lá o danado do sample, que maravilha! Justamente uma música que quando ouvi a primeira vez eu pensava – “não é possível que alguém ainda não tenha usado isso aqui”. Como diz meu mano Black Alquimista“a magia do sampler é a coisa mais loka do Hip Hop!”.

James Yancey, obrigado por tudo e por tanto!

Confira de onde ele tirou o sample

Pra quem curte pesquisar sobre Hip Hop, existem inúmeros sites e fóruns espalhados pelo mundo com muita informação que vai além, mas muito além, dos feeds e memes, e é uma surpresa navegar por alguns e ver que o Bocada Forte é tido como referência quando os criadores e usuários desses sites e fóruns pesquisam sobre Hip Hop brasileiro. E aqui eu tô falando de pesquisa mesmo, não é uma simples consulta nas primeiras páginas dos buscadores. No acervo do Bocada Forte tem matérias com indicações de sites, blogs e fóruns que estão ativos até hoje, é só pesquisar. Bora abandonar o “manda o link”, “manda o print”, a mesma internet que serve pra dancinhas e memes, também serve pra pesquisar e se informar.

Essa é a outra faixa produzida por Dilla em 1994

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