Opinião: Genocídio da Juventude Negra

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”Os sociólogos preferem ser imparciais, e dizem ser financeiro nosso dilema, mas se analisarmos bem mais você descobre que preto e branco pobre se parecem mais não são iguais” (Racionais MC’s)

Por: Djneew Dê Loná
Arte: FSP

No dia 18 de dezembro de 2014, aconteceu uma grande manifestação na região central de São Paulo, onde a pauta em questão era o combate ao chamado genocídio da juventude negra, não foi surpreendente que o maior veículo de comunicação do país não separou nem 30 segundos de seu principal telejornal diário para destacar esse ocorrido. Isso se deve a alguns fatores, um deles foi o de que não houve “brecha” para criminalizar a manisfestação, não quebraram agencias bancárias, não danificaram agências de automóveis e nem outras empresas privadas, ou seja, não machucaram os filhotes da emissora.

Outro motivo foi pura e simplesmente o boicote jornalístico: a negação de um fato baseando em números e sangue, assim como nega boa parte da população (até mesmo pessoas de dentro da cultura hip hop) acredita que não existe genocídio da população negra e que o problema é social e não racial.

Ainda ouvimos velhas frases impregnadas no cotidiano, as mais famosas e classicas “também, o que ele estava fazendo aquela hora na rua?”, e “se morreu é porque devia”. Então, realmente, muita gente anda devendo, devendo explicação. Segundo numeros do Mapa da Violência entre 2002 e 2011 o numero de jovens negros assassinados subiu de 79,9 % para 168,6 %. O de brancos caiu de 36,7% para 22,8%.

Existem organizações e movimentos que trabalham com a pauta do Genocídio da Juventude Negra  de diversas formas, porém,  a ”inspiração” para manifestação do dia citado acima surgiu dos atuais acontecimentos ocorridos nos EUA, onde milhares de cidades estão fervendo com passeatas e manifestações por conta da absolvição do policial que matou um jovem negro com 5 tiros de ”advertência”, fato que foi classificado pela revista Veja como uma ”farsa esquerdista”.

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Lá, como aqui, o plano segue, não é de hoje. Há alguns séculos, o plano de extermínio dos negros no Brasil foi a guerra contra o Paraguai, onde milhares de negros ganharam sua alforria para lutar na linha de frente da batalha, plano esse feito também pelos nossos vizinhos argentinos. Como a destruição física não teve suficiente êxito no Brasil, a ideia era embranquecer para esquecer, empreitada que também não teve sucesso pleno, mas termos como pardo, mestiço, mulato, moreno(o) claro, moreno ainda são disseminados.

Junte-se a isso a teoria do país onde não há guerra e todas as etnias vivem em harmonia num paraíso miscigenado, um lugar com futebol e samba. Mas não para por aí, não contabilizamos ainda a expulsão da população negra que morava em regiões centrais das grandes metrópoles. Não contabilizamos as mortes da população negra durante a ditadura civil militar ocorrida no Brasil e, ”se eu for falar de tristeza meu tempo nem dá”, mas dizem por aí que o problema é social. O plano continua. Hoje a desculpa é ”ele resistiu a prisão”, os movimentos culturais, o hip hop, a musica rap em especial teve papel fundamental na denúncia deste contexto. Se ainda não temos a tomada de consciência e a organização proporcionalmente comparada aos norte americanos, sem as denúncias e reflexões dentro do hip hop e dos movimentos sociais de anos anteriores teríamos ainda menos.

Esta situação começa a se acentuar a partir do momento em que a pessoa se assume como homem negro ou mulher negra, e não como ”moreninho claro” ou ”moreninha escura”, a partir do momento que alguem se assume dentro de determinado grupo, o que ocorre com outra pessoa desse grupo o atinge e causa indignação, talvez isso explique exatamente porque tanta indignação ocorre nos EUA com a morte de UM e aqui pela morte de milhares não acontece o mesmo em proporçoes semelhantes. Quantas vezes, preenchendo fichas de matrícula junto com os pais em uma escola estadual em São Paulo, perguntei qual a cor da criança ou do adolescente – requisito obrigatório no preenchimento na ficha de matrícula – por alto, quem não entrasse na escola e só olhasse as fichas de matriculas pensaria ser uma escola na Dinamarca, Suécia ou de outro país do leste europeu. A maioria se dizia branca, outra parte se dizia parda, alguns pais mesmo tendo a cor da criança evidente preferia dizer ” ele é meio moreno claro”.

O processo não é só de reconstrução de nossa história, mas o de desconstrução dos paradigmas e estereótipos. Apesar do hip hop não estar na chamada ”era de ouro” dos anos 90,  ainda é possível o diálogo com a juventude. Com a questão de identidade assumida talvez nos indignaremos mais, e não vamos achar natural a morte de jovens negras e negros.

O genocídio da juventude negra não é teoria acadêmica e muito menos marketing de ONGs, é assunto real, os numeros provam, os fatos provam. Na Argentina o numero de afrodescentendes caiu de 30% para 2% em questão de décadas, se continuarmos achando normal e coincidência que os jovens negras e negros estão morrendo,  não estaremos tão distante da mesma realidade em nosso país.

Saiu na Folha de S.Paulo de hoje:
Jovem negro corre 5 vezes o risco do branco de ser morto no Nordeste
Morte de jovens negros cresce 21% em 5 anos no país

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