Imprensa Negra: Editora publica edição fac-similar da ‘Revista Niger’
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Foto: Gil BF
Em 1960, 72 anos após a abolição da escravatura no Brasil, nasceu a revista Niger, Foram apenas quatro edições, mas suficientes para marcar a história da imprensa negra do país num país onde o racismo moldava (como ainda molda) as relações sociais. O projeto foi organizado por José Correia Leite e a Associação Cultural do Negro (ACN). Um dos seus mais ativos trabalhadores, o jornalista e escritor Oswaldo de Camargo, preservou os exemplares originais em seu acervo pessoal. Em 2025, 65 anos depois, a Ciclo Contínuo Editorial lançou a edição fac-similar da revista, devolvendo às novas gerações um documento fundamental da luta por voz, espaço e dignidade da população negra. É importante destacar a passagem dos anos nesta trajetória de escrita negra. A publicação tem textos de Camargo e Mário Augusto Medeiros da Silva.
O editorial de estreia afirmava que a missão da Niger era falar do negro em tudo o que merecesse comentário, aprovação ou crítica. O texto já anunciava a dimensão política e cultural da publicação, que se propunha a ser um espaço de reflexão, incentivo e união. “Uma das melhores armas para esclarecer, iluminar, retificar é a imprensa, mas para os problemas negros nada como uma revista ou um jornal negro”, escreveu o editor.
A proposta era ousada. Num período em que a mobilização política da população negra encontrava dificuldades para se consolidar, Niger se colocava como um chamado à organização e à autoestima, o termo não era utilizado na época, mas seu significado foi posto em prática. A revista não buscava apenas retratar a cultura, mas também debater os impasses da vida social e política do negro brasileiro. Era um caminho aberto para futuras gerações.

Textos como “Os falsos líderes e a política” expunham a exploração oportunista da cor por parte de indivíduos que se diziam representantes da comunidade, mas que agiam em benefício próprio, algo que vemos atualmente nas mídias sociais. Ao mesmo tempo, Niger abria espaço para destacar conquistas, como a presença de Carolina Maria de Jesus, que naquele mesmo período impactava o país com o livro Quarto de Despejo.
O projeto se manteve apenas por quatro edições, entre julho e outubro de 1960. A curta duração não diminui, no entanto, sua relevância histórica. Ao contrário, é uma referência de resistência para a imprensa negra dos nossos dias. Os motivos e desafios são semelhantes: barreiras estruturais, dificuldades financeiras, falta de apoio institucional, bloqueios impostos pelo racismo.
A reedição fac-similar em 2025 surge como reparação construída pelos nossos. Ao trazer de volta os textos originais, sem alterações, a Ciclo Contínuo Editorial coloca em circulação um documento que dialoga diretamente com o presente. Os debates sobre identidade, organização política e valorização da cultura negra seguem atuais.
A iniciativa de preservar e relançar Niger também aponta para a importância dos acervos pessoais e comunitários na preservação da memória negra. Sem o cuidado de Oswaldo de Camargo em guardar os exemplares, a revista poderia ter se perdido no tempo, como tantas outras iniciativas. A nova edição devolve ao público a chance de compreender o contexto histórico e político em que ela surgiu, além de reconhecer a força da resistência cultural.





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