Taz Mureb: “arte é libertação”

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A galera de São Paulo conhece os trabalhos de TAZ MUREB por meio da internet, mas é nas ruas do Rio de Janeiro que a MC mostra suas rimas e o respeito que conquistou no rap. Mureb lançou no final do ano passado o single “Gostosa”, música que gerou polêmica na cena e rendeu todo tipo de discussão.

Taz Mureb prepara seus novos projetos para 2015. A artista participou de um quadro do programa da Eliana, no SBT, vai lançar uma mixtape e um CD e está na correria para gravar o videoclipe de “Gostosa”, que será produzido por Ton Gadioli, diretor do documentário sobre o MC BLACK ALIEN. Abaixo, Taz Mureb fala um pouco sobre o seu trabalho, família, educação, machismo e aborda o papel da arte de rua.

Bocada Forte: A ideia da música “Gostosa” é contestadora. Você acha que muita gente entendeu errado as fotos que as minas mandaram para divulgar o som?
Taz Mureb: A ideia do som e a ideia do marketing foram todas minhas. A concepção é sobre o uso do corpo da mulher, como que no corpo da mulher está sendo usado na sociedade e como é diferente quando os caras expõem o corpo feminino. Quando o homem expõe o corpo da mulher, é uma parada, quando a mulher expõe seu corpo, é outra.

Uma galera entendeu errado, pois não entendeu o sarcasmo, né? A música é totalmente sarcástica, na real muita gente não entendeu e contestou. A ideia era ter um som que chocasse tanto machistas quanto feministas. Tanto a galera do rap quanto a galera que não é do rap. Pelo feedback que tive, uma galera que não é do rap gostou do som, mas a galera do rap achou que era música de vagabunda. Estes últimos não entenderam a concepção, acho que está faltando um pouco de estudo.

Bocada Forte: Foi um enfrentamento ao machismo logo de cara?
Taz Mureb: Sim, foi um enfrentamento ao machismo. Na verdade, vimemos numa sociedade machista, o rap é totalmente machista, muito sexista, as mulheres são muito machistas. Foi um dedo na ferida, pensei em dar uma abalada nas estruturas da sociedade. As pessoas falam que o machismo não existe, que crio polêmica à toa. A verdade é que não é à toa.

Foi legal o lance da divulgação, meninas com deficiência mandaram fotos, minas com estria, celulite, mães. Toda mulher é gostosa, precisamos ter nossa feminilidade respeitada independentemente do que fazemos com nosso corpo. Não cabe ao homem julgar, sabe? A sociedade tem N sites de pornografia, revistas de mulher pelada, o próprio rap usa o corpo da mulher, as bundas nos clipes. Tudo está OK, mas, se a mulher mostrar o corpo, ela é taxada de vagabunda. Que princípios são esses?

Bocada Forte: Você está preparando um disco para este ano? Pode falar sobre seus projetos?
Taz Mureb: Vai sair uma mix e um disco. Ganhei um Edital da Prefeitura de Cabo Frio pra finalizar meu CD. Tem umas críticas aí sobre uso de verba pública, mas acho que as pessoas não sabem como funciona um edital. Edital é uma concorrência para obter verba. Vou lançar um CD que se chama Rap de Água Salgada no segundo semestre. Agora, no começo do ano vou lançar a mixtape Rap de Mina, só com inéditas. Estou produzindo com a Máfia da Caneta. Taz Mureb 2015 vindo com tudo.

Bocada Forte: Você mescla uma pegada mais atual, elaborada e com apelo comercial, mas não abandona o discurso contundente e questionador. O que faz parte da sua formação no rap para conseguir ter inserção em alguns ambientes, mas sem se entregar ao oba-oba fútil?
Taz Mureb: Adorei essa pergunta. Na verdade, o mais difícil mesmo é conseguir encaixar essa parada mais comercial com a crítica. A partir do momento que você critica, fica muito estilo ladainha, sermão. O rap pecou muito por isso, por não entender que pode ser crítica, mas não precisa ser sermão. O sarcasmo foi um exemplo dessa pegada de conseguir ser comercial e crítico.

Minha formação eu conquistei na rua, mas a galera se preocupa muito em estar na rua esquece o estudo. Eu tenho uma formação em relações internacionais. Sempre estudei, gosto de ler, gosto de filosofia, política, ficção.

Bocada Forte: Fale sobre sua recente participação num quadro do programa da Eliana, no SBT.
Taz Mureb: Então, eles entraram em contato comigo porque queriam o ponto de vista de uma MC. Apesar de não ser um programa voltado pro rap, eu achei importante mostrar um outro perfil de mulher, mudar os padrões da participação feminina na TV, mostrando um pouco da cultura urbana e do pensamento feminista contemporâneo. O que mais deu repercussão foi uma cortada que eu dei no Latino e num cara que nos comparou com churrasco.

Bocada Forte: Em 2014, com essas discussões sobre política nas redes sociais, muita gente do hip hop mostrou sua face conservadora e de direita. O que você acha disso, foi uma surpresa ou a rua já mostrava essa postura “reaça” de muitos artistas e militantes?
Taz Mureb: Acho que todo artista que não é ativista já é reacionário, conservador e de direita. A arte é a libertação, é a revolução. Quem não está fazendo revolução com a arte não está fazendo arte. Está usando arte apenas como forma de obter benefícios pessoais. Isso já estava sendo mostrado há muito tempo com a falta de engajamento dos artistas. Não adianta meia dúzia de artistas levantar uma bandeira se os artistas que já tem espaço na mídia não levantarem nenhum tipo de bandeira. Isso vai dando pra arte uma cara apenas comercial.

Bocada Forte: O rap faz parte das ideias que você passa para o seu filho? Como é educar um filho passando princípios e valores libertários num mundão machista? Tem algum medo?
Taz Mureb: Tenho medo do meu filho ser machista. Em pleno século 21, em pleno 2015, existe machismo ainda. Eu passo pro meu filho a questão da igualdade. Eu não entendo como a gente está discutindo ainda estes pontos do valor da mulher na sociedade. Somos mães, somos geradoras, a gente não tinha nem que estar discutindo certas coisas. Eu passo pro meu filho muita justiça, igualdade, liberdade. Acho que essa é a criação do rap. Meu filho tem quatro anos e ouve Mos Def. Ouve não, canta Mos Def. Tudo na linguaguem dele, mas toda vez que ele faz isso, eu sinto que acertei.

IMGQue a gente consiga ensinar nossas crianças passando valores libertários. Que elas quebrem padrões e paradigmas. Ainda tem mulheres sendo apedrejadas em praça pública, ainda tem mulheres sendo vendidas como dote para maridos lá no Oriente Médio. Achar que isso não existe é tapar o sol com a peneira. Vamos abrir os olhos das nossas crianças, senão chegam aos 14 anos e encaram a desilusão. Tem um monte de pai e mãe educando os filhos com conto de fadas. A criança com 12, 13 ou 14 anos vai pra rua e começa a ver que não é aquilo, que o pai e a mãe estavam mentido.

Temos que educar com verdade, educar com amor, mas sempre abrindo os olhos das crianças pras sutilezas do mundo. Fui criada num ambiente muito livre, sou libertária mesmo. Liberdade, igualdade e esclarecimento, sempre.

Bocada Forte: Pra fechar e te deixar em paz. Quem serão seus parceiros de beats, produção e rimas nestes dois projetos que você lançará em 2015?
Taz Mureb: Ainda estou negociando algumas coisas, esperando a verba do CD sair pra começar estes projetos, mas a ideia é que a direção musical seja do Yuka, tem os beats do Beni, da Máfia da Caneta, tem WC, Mel beats, também estou vendo com o Saim, quero pegar uma produção com ele. Nas participações pro CD, tem o Helio Bentes, do Ponto de Equilíbrio, Funkero, Guitierrez, quero fazer uma faixa bem pesada com eles. Já troquei uma ideia com o De Leve, to vendo com o BNegão, pretendo fazer uma faixa com ele e com o Yuka. Tem muitos amigos do rap ainda, posso fazer uma parada com o Costa Gold, lá de São Paulo, tenho vontade de gravar um som com o Rani. Tem meu som com o Ret, que está na maior expectativa.

Bocada Forte: Putz! Eu iria parar, mas você falou do Felipe Ret. Não posso deixar de perguntar. Qual sua opinião sobre a declaração infeliz dele no ano passado. Chegou a conversar com ele sobre isso?
Taz Mureb: Eu não opino e nem critico opinião de outros artistas. Acho o Ret genial, ele é meu amigo pessoal. Acho que ele é muito bom marqueteiro, saca? Acho o marketing dele sensacional.

De maneira geral, eu prefiro um artista polêmico a um artista déspota, de um artistas que só fica em cima do muro, de um maria-vai-com-as outras. Acho que o artista tem que ser polêmico, tem que incitar o debate. Às vezes eu posso nem estar concordando com aquilo que estou falando, mas falo só pra causar um debate geral, para fazer a galera raciocinar.

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