Opinião: Quando o questionamento é sufocado

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Uma mídia alternativa que pretende crescer para se estabelecer nos moldes das grandes corporações perde seu sentido

Por: DJ Cortecertu

Em dias de discursos que valorizam a diversidade e a subjetividade apenas para diluir qualquer ação que vise o coletivo, muita gente trabalha em busca de um sonho, algo que ultrapasse o sucesso individual, mesmo sabendo que está seguindo em sentido contrário ao que está sendo imposto em nossa cultura, principalmente no rap.

No “top ten” temático do rap, existe pouco espaço para o debate proposto pela ala politizada e militante do hip hop, mas, já que sabemos que as grandes corporações não têm interesse nas pautas sociais do movimento, o que a mídia alternativa faz para mudar essa realidade? Qual o papel dos blogs, sites e páginas nas redes sociais que divulgam e abordam a cultura de rua?

Do ponto de vista do mercado, falar apenas dos artistas que estão no topo e são os mais comentados nas redes sociais rende mais visibilidade, “likes” e anúncios. O novo tênis do MC Beltrano, a gravidez da mais nova diva da música pop, o fim do namoro do rapper Fulano, as nádegas da cantora Tal sendo elogiadas pelo produtor Siclano, entre outras tantas notícias, precisam estar nos destaques, afinal todos estão falando a respeito disso. Muitas vezes, ficar fora dessa onda ou propor outra pauta significa falar sozinho. Será?

Não falar de certas coisas, não dar visibilidade ao que é realizado na base são formas de seguir sem tentar fazer parte da mudança. Não falo dessa mudança que tem o artista Lobão como um dos líderes raivosos dos indignados e insatisfeitos com o governo atual, que utilizam a intimidação e pedem intervenção militar para provar que estão certos, pois carecem de argumentação. Falo da luta promovida pelos movimentos sociais que pressionam e pressionarão a presidenta Dilma nestes próximos quatro anos.

Rap do vencedor, mas quem perde?
Em diferentes sentidos, o céu é o limite para muitos artistas da cena, mas está mais que na hora de colocarmos os pés no chão e pararmos de esperar que falem o que queremos. Cada um representa o que quer.

Antes que me acusem de dirigismo, afirmo que a diversidade deve existir no rap e no hip hop, mas não nos moldes que citei no primeiro parágrafo deste texto.

Já faz tempo que o hip hop e seu elemento rap – assumindo ou não – são divulgadores das belezas e maravilhas do mundo neoliberal. Mas existe algo mais preocupante: aqui no Brasil, MCs alinham seus discursos aos dos políticos da direita homofóbica, racista e machista. Jair Bolsonaro e seu filho, Coronel Telhada, Marco Feliciano e Silas Malafaia, entre outros, são suas referências. Alguns rappers até compartilham textos de pessoas como o jornalista conservador Reinaldo Azevedo, da revista Veja e da rádio Jovem Pan, curtem páginas que propagam ideias reacionárias, são fortes nos comentários de cunho intolerante, amam – de maneira descarada ou disfarçada – o fundamentalismo religioso.

Isso acontece quando o espaço para o questionamento da ordem vigente é reduzido, ridicularizado e atropelado pelo rolo compressor do “make money”.  Tudo isso está cegando as pessoas e limitando as ideias políticas de muitos jovens.

Sim, o rap não é o único culpado, são coisas que estão postas bem antes do hip hop. Rappers conservadores podem fazer suas escolhas, nossa constituição garante esse direito, mas essas ideias e doutrinas já são divulgadas exaustivamente, e muitas delas são formas de negação de direitos civis. Aí não!

São outras vias que interessam e formam o hip hop combatente. Estas outras lutas podem não render popularidade, mas precisam ser destacadas. Caso contrário, o rap poderá também ser um grande porta voz da extrema-direita.

Uma mídia alternativa que pretende crescer para se estabelecer nos moldes das grandes corporações perde seu sentido. Não podemos esquecer que a periferia segue sangrando.

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