Por nós… Pra nós

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Ouvir apenas um lado, calar o outro. Essa é a pegada dos exterminadores da democracia

Direto ao ponto. Todos tem o direito e o dever e combater a corrupção, mas vamos escurecer uma coisa: parte dos defensores do golpe odeia os que não são como eles, desprezam os que consideram que não são “normais, trabalhadores e de fé verdadeira” (não preciso citar os grupos que não fazem parte dessa normalidade imposta). É notória a cólera destes manifestantes quando são confrontados com outras opiniões, vivências e realidades. Ouvir apenas um lado, calar o outro. Essa é a pegada dos exterminadores da democracia. São cidadãos de bem que, em parte, apoiam Jair Bolsonaro, mais como pitbull raivoso sem focinheira, menos com argumentos.

O golpe contra a democracia continua em curso, não esqueceremos dos que foram coniventes com uma sequência de violências e manobras políticas sujas, atitudes tomadas apenas para que seus interesses fossem atendidos. Não esqueceremos a campanha midiática e a narrativa tendenciosa dos grandes grupos de comunicação.

Periferia
Só que o buraco é mais embaixo. Em meio ao caos político a periferia segue sangrando. Antes desse caos não foi diferente. O grande problema é a violência contra diferentes grupos sociais que prossegue em nosso elogiado, aclamado e sempre resgatado Estado de Direito. O grupo de rap O Levante já abordava essa parada no CD Estado de Direito, Estado de Direita, as atrocidades e manipulações misturadas em nossa democracia sitiada.

Fábio Emecê, MC, colaborador do BF e ativista do Coletivo Muntu, afirmou recentemente em entrevista ao blog Afro 21, “nenhum governo se mostrou capaz de cessar a violência policial, o genocídio do povo preto e tantas outras mazelas que nos atingem. Nem chegaram perto de erradicar”.

A fala do MC abriga uma dura realidade. A prisão injusta de Rafael Braga, a impunidade em relação aos policiais que arrastaram Claudia Ferreira da Silva, o fuzilamento dos jovens que estavam num veículo voltando de um passeio no Rio de Janeiro, o assassinato de Luana Barbosa dos Reis, em Ribeirão Preto, entre uma infinidade de casos, não estão na lista de prioridades da maioria dos políticos, da mídia tradicional e da grande massa justiceira pró-impeachment.

Mídia alternativa
Com tantos acontecimentos que representam ameaça aos que não se enquadram na normalidade citada no primeiro parágrafo, e mesmo sabendo que, como disse Frei Betto, o atual governo federal “só lembra dos movimentos sociais na hora de apagar incêndios”, os coletivos mostram sua força para conter essa onda conservadora que segue contra a periferia, mas sabem que precisam de mais adesões. Aí entra o papel da mídia de esquerda, dos sites e blogs progressistas: fazer a informação chegar nos bairros distantes, onde os conservadores plantaram e estão plantando suas sementes. Algumas notícias, denúncias e imagens que retratam o descaso com os mais pobres e a população preta não são nada belas, podem chocar os leitores e seguidores dos sites e blogs, mas a realidade é muito pior. Pintar com cores fofas a linha do tempo das páginas nas redes sociais, ocultar posts sobre os abusos de poder nas fanpages para não agredir o leitor são atitudes que prejudicam apenas um lado, e sabemos bem qual lado é.

[+] Leia “Quem virou as costas pra quem?”, artigo do Movimento Mães de Maio

Por nós e pra nós, o futuro consiste nessa parada, pois a direita e a ultra direita movem rapidamente suas peças com o apoio da grande mídia, que diz que brasileiros só são os que apoiam o golpe. A esquerda não pode trilhar o mesmo caminho. Citar os avanços e conquistas da gestão PT e não protestar contra os abusos e mortes que fazem parte do cotidiano dos mais pobres e pretos colabora para a invisibilidade de demandas sociais e raciais em nome de um bem comum que nunca é alcançado, pois, no Brasil, quando se trata de questões como o racismo, esta ideia de bem comum parece que sempre é lembrada para imobilizar as discussões e inviabilizar ações.

Hip Hop
A articulação e a arte do hip hop combatente faz a diferença, marca posição neste período conturbado. Vamos escurecer outra coisa: ser do rap e do hip hop não significa ser de esquerda, mas não ser de esquerda não deveria significar virar as costas para as demandas dos povos indígenas, para o genocídio da juventude negra. Não ser de esquerda não deveria significar negar o machismo que mata diariamente, não deveria significar passar um pano para torturador, homofóbico, racista.

Grande parcela dos amantes e artistas do hip hop foi formada num período político e econômico que, de um lado, privilegiou o não pensar, do outro, proporcionou uma mistura de indiferença, doutrina liberal, conservadorismo, discurso de ostentação e conexão com as novas tendências da música pop mundial. O resultado pode ser conferido nos depoimentos e comentários de muitos rappers e fãs de rap nas redes sociais.

Não se iludam senhores, a maioria que apoia essas ideias de direita não cabe na igualdade pregada pelos golpistas em protestos pacíficos nas ruas. Como diria Dina Di: “Eles falam de paz…quando paz não há”. Deixo aqui um grande salve aos integrantes do hip hop (militantes, rappers, MCs, DJs, escritores, jornalistas, produtores e blogueiros) que se posicionam a favor da democracia e também protestam contra a desigualdade sofrida pelos nossos. Podemos não estar entre os vencedores, mas a história vai mostrar em que lado estivemos num período político embaçado, num tempo em que até o medo de perder curtidas nas redes fabrica o silêncio de muitos.

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